quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Os empresários vistos pelos escritores viii

A Floresta de Sophia de Mello Breyner


Isabel, a protagonista de A Floresta de Sophia de Mello Breyner, encontrou um anãozinho que fora condenado a guardar as moedas de ouro que um salteador arrependido lhes deixara para a um homem bom. Há duzentos anos que esperava por isso porque o que tinha havido, quando se soubera que o malfeitor morrera, fora uma corrida ao ouro que levou à destruição da floresta. Neste conto, o ouro, o dinheiro, a riqueza são sempre da cobiça e do excesso. O salteador, à hora da morte confessa-se aos frades: “os crimes que pratiquei, pratiquei-os todos por amor à riqueza. Quando eu era pequeno era pobre e corria descalço nas ruas. Comecei então a invejar a fortuna dos ricos. Invejava os sacos cheios de oiro, os fatos de veludo, as jóias, as casas opulentas. Decidi ser rico. Durante mais de 20 anos roubei e matei para enriquecer. Parecia-me sempre que não havia oiro que me pudesse saciar. Quanto mais rico eu era mais amava e desejava o dinheiro”. Pede então aos frades que para expiação das suas culpas façam do dinheiro uma obra boa – “Frade, transforma em bem o fruto do mal” como um aviso singular: “Mas tem cuidado, frade: aquele a quem deres o dinheiro tem de ter uma alma inteiramente pura pois o dinheiro é um veneno que destrói os espíritos mais fortes”.

O eleito para resolver o problema do anãozinho é o professor de música de Isabel, que diz sempre: “a fortuna, a glória, o dinheiro não contam. Só a verdade e a beleza é que nos dão felicidade”. Este sugere então que se façam chegar as moedas ao laboratório do Doutor Máximo, um cientista excêntrico, que queria transformar pedras em ouro para acabar com a pobreza. Quando se soube, o inventor foi alvo de várias homenagens e glórias. E como não podia deixar de acontecer aguçou o sentido aos banqueiros e negociantes que em fila foram falar com o sábio. O primeiro que foi recebido disse: “caro amigo o oiro é um metal precioso. É o alimento, o sangue e o nervo das civilizações. É preciso empregá-lo bem. Eu venho ensiná-lo a empregar o seu oiro. Traga-lhe um negócio magnífico que nos dará a ambos grandes lucros”. O sábio recusou-se este e todas as outras propostas porque não amava a fortuna “e podia transformar pedras em oiro”.

Há duas mundividências comuns à literatura quando se aventura pelos caminhos do dinheiro, da riqueza, do trabalho. O primeiro é o axioma de quem trabalha não enriquece e que a aqui surge pela voz de um dos sete mais ricos da cidade: “até aqui os pobres trabalhavam para ganhar o sustento e os ricos trabalhavam para ficar mais ricos. Mas daqui em diante ninguém mais há-de querer trabalhar”. A outra é, mais do que a poupança, a acumulação de capitais sobretudo rápida. Mas neste conto, que é colocado em questão é precisamente o pé-de-meia. Como refere um dos sete: “quando o oiro for abundante pouco valerá. E então que será feito de todos aqueles que passaram a sua vida a fazer economias e que juntaram com tanto amor uma moeda de oiro ao canto da gaveta? Vamos ficar todos arruinados !”.

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