sábado, 5 de janeiro de 2013

Os empresários vistos pelos escritores vi


Em Portugal, Henry Burnay foi um alvo privilegiado para jornalistas e escritores. Raul Brandão recorda nas suas Memórias, o projecto de um livro sonhado por Fialho de Almeida e que nunca chegou a escrever, chamar-se-ia A Cloaca e “o primeiro capítulo está feito: é uma festa da alta sociedade no claustro da Batalha... Aproveito a época do Burnay e do marquês da Foz, a luta da finança, quando o Foz tinha palácios e o Moser carro a duas parelhas. Deram-se festas esplêndidas... Tenho as figuras todas, homens de negócios e jornalistas, o Mariano e o Navarro... um dia alugam um comboio e vão dar uma festa no claustro da Batalha. É uma ceia formidável, com mulheres de grande roda, políticos, literatos e, dentro do claustro, entre a grandeza e a severidade daquelas pedras, caem de bêbados e mijam pelos cantos, nos túmulos». Fialho de Almeida chamou-lhe «pulgão polimórfico» e Eça de Queirós ter-se-á inspirado em Burnay para a criação do banqueiro Cohen de Os Maias.
Quem não se cansava de fazer do Conde de Burnay o alvo das suas caricaturas e dos seus dichotes, era Rafael Bordallo Pinheiro. Nos seus jornais parecia obcecado pelo Grande Plutocrata, o homem que na imaginação popular, como refere Maria Filomena Mónica, «transformara-se no capitalista por excelência, judeu na origem, internacional nos contactos e dissoluto nos costumes». Na edição de A Paródia de 18 de Dezembro de 1901 retrata-o como um ser longíneo com uma grande mão direita a segurar o mapa de Portugal, enquanto na esquerda se vê um banco de madeira onde o banqueiro se preparava para colocar o país, enquanto ao lado soavam as seguintes estrofes:
Estrangeiro, banqueiro, onzeneiro, folião,
Tem Portugal inteiro apertado na mão:
bancos, províncias, oiro, hotéis, homens, governos,
Querelas, concessões, coroas, céus, infernos,
Companhias, jornais, dinheiros fortes, fracos,
Ministros, imbecis, capelas e tabacos,
Virgens de Santo António, o mapa, os usurários,
Festas nacionais, misérias, centenários,
o clero, a fome, o sangue, o riso... Tudo agarra!
Não é mão, é tenaz! Não é tenaz, é garra.
Para se perceber a dimensão do império, socorremo-nos de um texto de Ramalho Ortigão, comentado por João de Sousa Câmara: “querem dinheiro? Aqui está às ordens: podem ir passando os recibos”. E ergue, acrescentamos nós, a casa bancária Henry Burnay & Ca. “Querem fazendas? Aqui têm amostras à escolha”. Arrenda, adiantamos nós, o Palácio de Cristal e organiza mais tarde os grandes Armazéns Hermínios. (...) “Desejam navegar, serve-se-lhes navegação a vapor!”. E logo levantava a Companhia de Navegação Thétis no Porto. “Convém-lhes segurar alguma coisa, têm aqui companhia que segura tudo!”. E imediatamente criava uma sociedade de seguros.


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