sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Gestores da alegria


Nos anos 30/40, na Ford Company, o riso era objecto de sanção disciplinar. Como se recordarão muitos gestores e trabalhadores portugueses de milhares de empresas nacionais em que a mudez era (é?) de ouro e o riso e o bom humor demoníacos. Uma reminiscência monacal em que se considerava que o riso, que era uma forma de romper subversivamente essa passividade, seria uma das tentações do demónio para desviar os monges do caminho da oração.

Nas organizações do conhecimento, o humor terá, sem dúvida, um papel importante. Para já, até se utilizam os “sketches” de humor para explicar aos caixas de um supermercado como ser simpáticos/as (e se por que não sedutores/as?) naqueles segundos em que estão frente a frente com o cliente. Isto é em formação porque ainda não se fizeram os Gestores da Alegria, uma espécie de palhaços que irromperiam nos conselhos de administração, nas assembleias-gerais de empresas, no quotidiano das empresas, para lhes darem uns momentos de boa disposição. Embora isso já aconteça com as chamadas happy hours, reuniões em ambiente outdoor, e, em congressos sectoriais já é usual aparelharem speakers de grande peso em dólares com humoristas de grossos cachets. E já empresas que albregam e promovem os seus palhaços, embora normalmente estes contem piadas mas tenham a alma negra do Joker do filme Batman.

As empresas lidam mal com o humor. Não é um defeito seu nem é um seu exclusivo. O humor está muito próximo da subversão e, por isso, sempre que se impõe uma hierarquia, que tem os seus códigos e os seus papéis, os seus ritos e os seus rituais, o humor torna-se (e toma-se) por uma ameaça. Mas o humor pode ser uma fonte importante para se fazer passar mensagens, se meditar nos erros, suavizar embaraços e más decisões, comentar laços nas equipas. O humor pode servir para se dizer as verdades de forma mais agradável ou até para se demolidor. Jack Welch que durante 20 anos liderou a General Electric costumava referir-se à organização “sloaniana”, que durante impregnou a General Motors, como a que a tinha “a face virada para o CEO e o rabo para o cliente”.

O humor como ferramenta de gestão não é de fácil manuseamento por parte das organizações. Mas para medir a malha de humor das empresas bastaria disseminar pelas ordens de serviço, recomendações, directrizes os pequenos cartoons que vêm nas duas páginas mensais da Harvard Business Review, nas tiras de Dilbert ou de Luís Afonso ou vídeos da série The Office. Há pérolas como a história que permite explicar que, muitas vezes o negócio tem uma lógica que nem sempre é a lógica do negócio. Mas é uma história que não pode chegar aos ouvidos dos nossos responsáveis pela Cultura. A história intitula-se “Relatório de um Consultor em redimensionamento após ter assistido à Sinfonia Incompleta de Schubert”. E diz o seguinte: “durante períodos relativamente longos, os Oboés não tocam nada. O seu número devia portanto ser reduzido e o trabalho respectivo distribuído por toda a orquestra, por forma a evitar picos de ineficiência. Os 12 violinos tocavam exactamente o mesmo. Isto é uma duplicação desnecessária pelo que o staff deveria ser drasticamente reduzido. Se é só por uma questão de obter maior volume isso poderá conseguir-se com um amplificador. Não se vê qualquer utilidade prática em repetir nos instrumentos de sopro, as passagens acabadas de tocar pelos violinos. Se estas redundâncias forem eliminadas consegue-se reduzir em cerca de 47% o tempo do concerto com todas as poupanças que daí advêm.

Esta Sinfonia tem 2 andamentos. Se o dito Schubert não conseguiu os seus objectivos até ao fim do 1º andamento deveria ter ficado por aí. O 2º andamento é um desperdício portanto deveria ser eliminado. Perante estes factos, poderá concluir-se que se Schubert tivesse tido o nosso apoio a sua Sinfonia hoje estaria completa”.
O humor na organização tem vários papéis e funções. Num serviço de emergência médica, o humor surge como forma de lidar com os traumas. Noutras profissões e locais surge como um mecanismo de descompressão de tensões, de inspirar criatividade. Faz parte da cultura organizacional. Como diz David L. Collinson em “Managing Humour” (Journal of Management Studies, Maio de 2002), “as anedotas que as pessoas contam no local de trabalho podem revelar tanto, ou às vezes mais, acerca da organização, da sua gestão, da sua cultura e dos seus conflitos, como as respostas cuidadosamente dadas nos inquéritos”.
Publicado no Jornal de Negócios em 2003

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