sexta-feira, 22 de março de 2013

Coração ou carteira

Um empresário português, Nelson Quintas (1924-2001) dizia: “não meto as empresas no coração, meto-as na carteira”, mas o que é certo que usava sempre a carteira no bolso mais próximo do coração.
As empresas familiares são, muitas vezes, uma actualização da história bíblica de Caim e Abel e conseguem criar uma intensidade dramática que tem feito as delícias de produtos televisivos como séries e telenovelas pelo que peso que detém esses universais que são o dinheiro, o poder, a paixão e a família. Como confirma um estudo Josep Tàpies, professor de Empresa Familiar do IESE, das 2300 empresas familiares estudadas só 24 não tinham tido conflitos familiares. Para Portugal, segundo dados da Associação Portuguesa de Empresas Familiares (APEF) em 2010, menos de 40% das empresas familiares em Portugal conseguem atingir a segunda geração, e apenas 10% a 15% sobrevivem até à terceira geração. Uma das maiores vulnerabilidades das empresas familiares de qualquer dimensão é a “transição geracional”.

Contudo, as empresas familiares não têm só de se defrontar com o seu futuro. Têm, como frequência, que se confrontar com o passado e com o peso e a sombra dos self made man que lhes deram corpo. Estes crêem-se, quantas vezes, eternos e incapazes de compreender e aceitar a convivência entre várias gerações e a partilha de poderes e de responsabilidades. Preferem a solidão do poder e da decisão até ao fim contra todos e custe o que custar, e que é no fundo a essência do empreendedor e o factor distintivo dos demais mortais. Do dinheiro, como diz Belmiro de Azevedo, todos os empresários gostam, mas há outras forças que impelem estes construtores de empresas e de emprego e que são sobretudo a vontade de fazer – por isso José Manuel de Mello dizia que um empresário não se reforma – e o desejo de posteridade, ou seja, que a sua obra perdure. Mas estes diferendos reais e os conflitos possíveis seriam uma questão lateral se não sucedesse que, como referem Grant Gordon e Nigel Nicholson em  Family Wars: Classic Conflicts in Family Business and How to Deal With Them:  “as empresas familiares são a espinha dorsal da economia de quase todos os países da Terra, e a riqueza das nações depende delas”.

1 comentário:

  1. Na História, as empresas familiares foram a estrutura empresarial fundamental dos Burgos. Sem elas não teriam sobrevivido estruturas industriais ou comerciais, que estiveram na base sociológica de muitas grandes cidades europeias ou asiáticas. São as que sobrevivem às guerras... Conheci o Sr Nelson Quintas em Luanda, era eu criança e convivi com ele muitas vezes, até ao fim do império colonial português (se é que já acabou, pois por vezes pergunto-me se a Madeira não será uma colónia a precisar de independência). Como dizia, as palavras não coincidem com a memória que tenho dele. Era trabalhador e tratava bem os empregados. Tinha "carinho" pelas empresas e transmitia essa cultura aos descendentes. Talvez tenha aprendido é a sofrer com a perda d'outra forma. Por exemplo, não chorando. A afirmação que é citada no início será mais nessa direcção:«Um Homem não chora».

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