sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

É essencial gerir


Mesmo que haja um só caminho, há sempre várias formas de preparar a caminhada e de o percorrer.
A história é antiga, tornou-se um exemplo canónico para inúmeros teóricos e práticos da gestão, o últimos dos quais Jim Collins e Morten T. Hansen em Great by Choice, e conta-se em dois parágrafos. Há cerca de 101 anos, duas equipas, uma liderada por Roald Amudsen e outra por Robert Scott, partiram à conquista do Polo Sul. O primeiro cumpriu o objectivo e regressou para contar enquanto o segundo sucumbiu na sua empreitada. A moral é que para um objectivo pode haver vários caminhos, formas diferentes de agir, motivar, planear, e que afinal até pode haver alternativas. Por isso talvez fosse uma boa altura para trocar umas ideias sobre gestão, como parece ser a intenção de Teodora Cardoso, presidente do Conselho de Finanças Públicas, quando disse: "É essencial gerir melhor." Por isso, talvez seja importante que no meio deste vendaval fiscal e da cacofonia europeia que se fale sobre a gestão em Portugal.
Fernando Pessoa, que podemos considerar como o primeiro teórico de gestão português, reflectiu, e com alguma minúcia, sobre os preceitos práticos da boa gestão e da excelência empresarial, e o cerne da sua preocupação era a organização, o que não deixa de ser interessante porque é hoje provavelmente uma das principais causas para as nossas dificuldades, a tão decantada competitividade do país. Para Fernando Pessoa a organização era mais do que um processo tecnológico e um conjunto de procedimentos. A sua visão estava próxima do que hoje chamamos gestão. Dizia que “a organização é, por sua natureza, um fenómeno intelectual, um trabalho de inteligência”.
Noutros textos, alguns dos quais publicados na Revista de Comércio e Contabilidade, dizia que “organizar é, essencialmente, um fenómeno intelectual. Há muitas coisas que se executam por palpite, imensas que se fazem empiricamente, pelo hábito e a experiência. Mas a organização estável, ou seja a organização propriamente dita, é um trabalho de inteligência”. No texto Processo de Organização escreveu que "sistemas, processos, móveis, máquinas, aparelhos são - como todas as coisas mecânicas e materiais - elementos puramente auxiliares. O verdadeiro processo é pensar; a máquina fundamental é a inteligência." Se alguma lição de actualidade se pode retirar destes textos de Fernando Pessoa é a sua insistência na inteligência (que é educação, que é formação, que é discernimento, que é ciência, que é subir na cadeia de valor, que é gestão e organização) como principal recurso estratégico para o nosso desenvolvimento.
Filipe S. Fernandes

Os textos citados encontram-se em Filipe S. Fernandes, “Organizem-se! A Gestão Segundo Fernando Pessoa”, Oficina do Livro, Lisboa, 2007.

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