É aos 54 anos autor de uma das obras mais
vastas e relevantes na historiografia económica portuguesa recente e defende
que o Estado não precisa de crescer para intervir. Basta ter política económica
e deixar de não fazer nada para resolver os problemas económicos. Com formação
económica, os seus domínios de eleição são a História Económica dos séculos XIX
e XX, nomeadamente as questões relacionadas com o crescimento económico no
longo prazo de Portugal e dos países periféricos da Europa, a integração
europeia e os problemas actuais da economia portuguesa. Investigador
coordenador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, publicou
recentemente o terceiro e último volume da História da Caixa Geral de Depósitos,
1876-2010, e História Económica de Portugal, com Leonor Freire Costa e Susana
Münch Miranda.
O debate da industrialização
atravessou todo o século XX e está de regresso com o novo projecto de
re-industrialização.
Fazendo
comparações com o resto da Europa, e é esta que interessa porque foi a primeira
região industrial no Mundo, Portugal industrializou-se tarde, e tão tarde que o
sector industrial nunca foi o principal sector da economia portuguesa. Primeiro
foi a agricultura e depois logo a seguir os serviços, mas de uma forma marginal
pelo que é mais uma curiosidade. O pico da industrialização chegou anos 70/80.
Desde então o peso da indústria na economia tem decrescido, mas mais lentamente
do que no resto da Europa, que é hoje em dia é uma economia de serviços. No PIB
europeu, em média, 80% são serviços, 3 a 4% agricultura e 16% indústria. É este
o padrão. De tal forma é assim que já estamos a entrar numa fase em que é insuficiente
a divisão agricultura-indústria-serviços.
Há
dias falando com uma pessoa que num banco está na concessão de créditos a PME
dizia que os bons projectos agrícolas hoje em dia são os que começam a análise
do projecto na comercialização. O que é que o consumo precisa, o que é que o
comércio necessita, que tipo de produtos é que é mais fácil colocar e a partir
daí partir para a terra e cultivar essas produções. A ideia agora da
re-industrialização nem faz muito sentido. O que faz sentido é perguntar se o
Estado deve intervir para que determinadas actividades não fechem numa crise.
Durante muito tempo o papel do
Estado na industrialização não era discutido mas agora é, o que complica mais a
solução do problema.
Agora
o papel do Estado na defesa de alguns sectores ou de algumas unidades
industriais foi reduzido a nível demasiadamente pequeno. Há países que vivem
bem com isso como a Grã-Bretanha. Se a indústria automóvel não sobrevive,
desaparece. Têm outras indústrias. Mas a Grã-Bretanha é um país especial no
contexto europeu mas também tem problemas porque o sistema financeiro cresceu
demais. A Alemanha nunca perdeu a sua base industrial. O governo do estado da
Baviera intervém se houver problemas na VW-Audi ou na BMW. A intervenção do
presidente Obama no sector automóvel nos Estados Unidos teve um grande sucesso pois
salvou a indústria automóvel e o governo americano acabou por não perder
dinheiro. Há sectores que atingiram uma dimensão tal que só o Estado tem
capacidade financeira para intervir, os bancos já não têm.
As exportações têm-se baseado nos produtos
de média tecnologia que no fundo são os têxteis e o calçado que são de facto a
matriz do nosso processo de industrialização e que se mantém muito activos.
Mas
isso faz sentido porque não há sectores mais modernos que outros ou empresas
mais modernas que outras. O que há em determinadas actividades é uma maneira
mais moderna de fazer as coisas, no sentido que tem mais produtividade e
competitividade externa que outras. Pode haver a concentração e modernização do
sector têxtil e isso representar aumentar a progressão na cadeia de valor. Uma
das actividades mais bem-sucedidas na Suécia é a Ikea. Se se for á genealogia
isso vem das florestas, madeira, pasta para papel, máquinas de fazer papel e
mobiliário e agora já é os serviços relacionados com a venda de mobiliário.
Porque é que este projecto de
re-industrialização do Governo não faz sentido, no seu entender?
Porque
neste momento mais uma vez a única forma que temos para analisar estes
problemas é através de comparações internacionais e em Portugal a indústria não
tem um peso demasiadamente baixo. O que faz sentido é ver neste momento actual
de crise quais são as unidades industriais e inclusivamente os sectores que
estão com dificuldades, têm potencial de crescimento e que merecem ser
apoiados.
Há
aquela ideia que o Estado não deve escolher porque isso interfere com o
funcionamento do mercado. Todavia, também é preciso ter em atenção que hoje em
dia os Estados, como as empresas, têm mecanismos de avaliação de projectos do
que há alguns anos atrás não tinham. Portanto o Estado pode usar esses
mecanismos de uma forma directa ou até indirecta. Neste caso financiando os
bancos e estes fazem esse trabalho de financiamento e avaliação. Não é uma
repartição pública que necessariamente tem de fazer esse trabalho. E para isto
não é preciso um Estado maior.
Mas por que é que é importante o
Estado intervir?
Por
exemplo, porque o Estado está preocupado com o nível de desemprego mas as
empresas não, obviamente, porque as empresas ao criarem desemprego estão a expulsar
um problema, o Estado não. Se há desemprego o Estado tem um problema
financeiro, mas o governo não gosta de falara nas coisas assim e portanto reinventa
a questão da re-industrialização. Aliás a conversa não faz sentido porque não
se fala de re-industrialização e logo a seguir faz-se um pacote de corte de 4
mil milhões, tal como não faz sentido lançar medidas contra o desemprego e logo
a seguir despedir uns milhares de funcionários públicos. É um governo bi-polar.
O objectivo dos planos do governo é
passar de 29% das exportações no PIB, média da última década, para 50% no PIB
em 2020 e criando excedentes na balança comercial…
Isso
é que é trabalhar mal! Mas o debate está tão viciado que é melhor recorrer a
exemplos. Recentemente vi uma reportagem televisiva em que se descrevia o
estado de degradação dos portos no Algarve e a sua gestão é superavitária. Não
há política económica, porque se houvesse detectava-se este problema e era
atacado de uma forma eficiente de maneira a que houvesse algum investimento
público ao qual se juntaria investimento privado. E com uma rentabilidade que
não é só empresarial mas, como o Estado intervém, de rentabilidade social. E
isto é mais importante do que conversas com a re-industrialização.
Nós estamos perante uma
ausência de política económica e esta ausência era propositada, fazia parte do
modelo inicial. Agora a conversa está a mudar um pouco. Há um ano atrás ninguém
falava de políticas de emprego, só se falava no investimento. Dizia-se que o
emprego era resolvido pelo investimento e pelo mercado. Agora já se fala em
políticas de emprego. É preciso muita atenção porque a economia portuguesa é
uma economia moderna, e o que tem acontecido nos últimos vinte anos nas
economias modernas da Europa e nos Estados Unidos é que as recuperações
económicas não são acompanhadas pela recuperação do emprego, porque a
tecnologia que está à disposição dos investidores substitui muito trabalho. As
empresas podem criar desemprego, aumentam a sua produtividade e a sua
competitividade mas depois é a sociedade que acarreta com os custos do
desemprego. Estes têm de ser internalizados pelas empresas porque elas fazem
parte da sociedade. A política económica é importante para gerir estas situações.
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