Troca o Técnico pelo ISEG
Jovem sóbrio, amante
do ténis, futebol e tiro, tendo sido campeão nacional desta modalidade, jogador
de hóquei em patins, Jorge de Mello recordava as sessões de cinema no cinema Eden,
de que eram proprietários que o avô lhe proporcionava. Nas férias fazia viagens
pela Europa nos navios das empresas do Grupo. E por desejo e insistência do seu
avô, ingressou no Instituto Superior Técnico, depois de completar o secundário
no Colégio Infante Sagres. Mas após a morte de Alfredo da Silva em 1942, Jorge
de Mello abraçou a sua vocação. Depois de terminar o serviço militar, em 1945, casou-se
com Maria Eugénia Mendonça e Menezes e inscreveu-se no Instituto de Ciências
Económicas e Financeiras (actual ISEG). Como explicou era a sua vocação por
teve “sempre mais interesse pelos aspectos financeiros”, “pelas análises de
projectos” até porque os engenheiros, “sobretudo os mais brilhantes, têm pouca
sensibilidade para os custos, acham sempre que é preciso pagar o que tiver de
ser para se ter a melhor solução técnica”.
O pai, Manuel de
Mello (1895-1966), foi uma espécie de regente do interregno entre a morte do
rei, Alfredo da Silva, em 22 de Agosto de 1942, e a ascensão dos príncipes,
Jorge e José de Mello, no fim dos anos 40, por isso foi quase sempre
subestimado. Trabalhou 23 anos com o sogro, Alfredo da Silva, que aliás lhe
fizera prometer que ao casar com a filha, Amélia Oliveira da Silva (1895-1958),
se casava com a CUF. O seu papel teria de ser secundário pois o seu tempo de
acção seria curto, e a sua doença fez com que esse tempo se abreviasse. No
entanto, se não teve o sortilégio dos empreendedores nem a aura do génio,
trouxe a previsibilidade do planeamento, a prudência dos organizadores. Manuel
de Mello foi sobretudo o “renovador prudente”, como lhe chamou o primeiro
número da revista interna da Lisnave em Janeiro de 1966.
Devido à doença do
pai, Jorge de Mello, que começou nos adubos, em 1947 já era administrador,
sempre gostou de fábricas, por isso preferiu manter-se à frente da Sociedade
Geral, da CUF e da Tabaqueira. Por isso interrompeu o curso que terminou em
meados dos anos 50. José Manuel foi o banqueiro da família, mas a paixão pelo
mar levou-o a ser o principal responsável pelos estaleiros navais da Lisnave.
Quando no fim da 2ª
Guerra Mundial, Portugal recusou o Plano Marshall, mas mitigou a visão
agrarista do desenvolvimento e abriu-se aos projectos dos denominados
industrialistas, que gizaram uma estratégia de industrialização autárcica e
administrativa. O Grupo Cuf era então, pelos capitais e pelas competências, um
dos mais vocacionados para aproveitar as oportunidades de desenvolvimento. Até
porque diria mais tarde Jorge de Mello, “o problema da economia portuguesa,
então como agora, é a falta de protagonistas empresariais que possam dar
conteúdo a essa selecção competitiva, pois nenhum mercado pode ser eficiente se
não tiver um número suficiente de empresas para que possa existir competição
entre elas. Candidatos a apoios há sempre muitos, mas empresários eficientes há
poucos”.
Na altura a base
industrial da CUF (que também tinha companhias de navegação, estaleiro naval em
Lisboa, uma casa bancária e um seguradora) distribuía-se por três núcleos
principais: o processamento das pirites do Alentejo para a produção de ácido
sulfúrico, base da indústria dos adubos e dos sulfatos, completada pela
metalurgia dos não ferrosos, e pela participação no capital da Companhia
Portuguesa do Cobre; o processamento de matérias-primas oriundas de África,
nomeadamente das oleaginosas e das fibras duras, a partir das quais o grupo
obtinha óleos alimentares, produtos de saboaria, sacaria, cordoaria e
tapeçaria; e o fabrico do tabaco.
Apesar do
proteccionismo e das actividades protegidas pela concorrência, a Cuf deu alguns
passos mais inovadores. Como recordava Jorge de Mello, tanto ele como o seu
irmão José Manuel, compreenderam, assim que tomaram as rédeas do grupo, que a
CUF era “já uma empresa complexa, cobrindo vários sectores de actividade e
exigindo uma gestão profissionalizada”. Por isso decidiram começar a fazer o
recrutamento de quadros nas universidades de engenharia e economia pois seriam
estes “os quadros técnicos da renovação” e que deram origem á denominada
tecnoestrutura da CUF. Tal como se sistematizou o “espírito CUF”, definido por
Jorge de Mello a 16 de Julho de 1955, numa cerimónia realizada para homenagear
os trabalhadores da CUF com mais de 40 anos de serviço, como sendo “não só
possuir vontade de acertar, dedicação e amor ao trabalho, desejo de
prosperidade para a sua empresa e elevado espírito de sacrifício. Significa
tudo isto e ainda: vibrar com as diferentes fases que a nossa organização vai
atravessando; a satisfação quando as coisas correm bem; o pesar quando correm
mal; viver como se suas fossem as alegrias, as tristezas, as desilusões da
empresa; lutar pelos seus objectivos e ideais como se fossem próprios”.
Nesta década, a vida
pessoal de Jorge de Mello também se alterara e, se os dez filhos (uma faleceu
pouco depois do nascimento) nasceram todos em Lisboa, o empresário preferia
Sintra para viver. Em 1958 comprou a quinta de Ribafria na Várzea de Sintra, que
pertencia ao pai e aos tios, e para onde a família se mudou em 1961. Adquiriu
também a herdade do Peral no Alentejo onde podia dar vazão à sua paixão pela
caça, pois era um exímio atirador. É por esta época que numa carta a António
Oliveira Salazar, de 19 de fevereiro de 1959, Jorge de Mello se define como
empresário e gestor: “há quem me atribua feitio demasiado dinâmico, arrebatado
e voluntarioso em excesso, só porque luto firme e tenazmente para que a
organização interna da União Fabril e das empresas suas afiliadas, onde
trabalham mais de 20 mil pessoas, não enverede por tendências ou jeitos
burocráticos (sempre de recear em grandes organizações”.
Parte do texto Publicado no Jornal de Negócios,
suplemento Weekend, de 15 de novembro de 2013